A vegetariana - Han Kang

sexta-feira, março 01, 2019 0 Comments A+ a-

  

   A vegetariana se relaciona muito com a "Redoma de Vidro" de Sylvia Plath no sentido de que ambos os livros tratam de mulheres que sucumbem por não suportar as pressões  e exigências que são feitas a elas.
   É interessante que, mesmo sendo um livro sobre o sofrimento psicológico de uma mulher, as duas primeiras partes são narradas por homens. Esses narradores, sejam em primeira ou terceira pessoa, só vem uma mulher ficando louca mas não conseguem ver o papel que eles próprios exercem nessa loucura - o estupro e abuso físico e moral de mulheres e normalizado por eles, o que favorece a sensação de desconforto que nos acompanha durante toda a história. Poucos são os momentos em que vemos o que se passa no mundo interior da protagonista (Yeonghye) mas esses poucos momentos é que mostram que há uma batalha interna muito forte acontecendo dentro dela, algo muito maior do que simplesmente não comer carne.
   Um dos momentos que mais marcantes do livro ocorre logo na primeira parte, em um almoço de família, quando o pai da protagonista fazer com que a filha como um pedaço de carne. Essa cena parece fora de cabimento mas é o resumo exato do livro, mostrando a apatia de alguns frente ao absurdo e o desejo de preferir a auto destruição que deixar que outra pessoa tenha o controle sobre seu ser (seu corpo) novamente.
   A protagonista do livro luta o tempo inteiro para ter controle sobre o próprio corpo, seja através do ato de não comer mais carne ou pelas atitudes mais extremas que se seguem. Talvez os sonhos de Yeonghye a tenham feito perceber que a indiferença que as pessoas sentem com a crueldade contra os animais é muito similar à indiferença contra os abusos que os maridos cometem contra as suas mulheres. Ou talvez eu esteja só divagando aqui e o ato não comer carne seja simplesmente a forma mais simples que a protagonista encontrou para ter algum controle sobre si.
Só no último capítulo é que temos uma narradora mulher, a irmã de Yeonghye. É então que temos uma perspectiva mais humana do sofrimento que a protagonista vem passando - será que a loucura dela veio assim do nada? Será que é algo que não poderia acontecer com qualquer outra mulher vivendo a mesma situação? A perda de lucidez de Yeonghye pode ser muito específica mas também vem de sofrimentos infelizmente muito comuns para muitas mulheres.
   Além de toda essa reflexão, que é praticamente universal, sobre o poder que a mulher tem sobre si e sobre seu corpo na nossa sociedade atual, também temos uma breve visão dos costumes e modo de vida da Coreia. Uma cena do início é particularmente chocante quando mostra um hábito relativamente comum na Coreia - os outros momentos são mais sutis, mas dá pra ver algumas diferenças e semelhanças culturais ao longo de todo o livro. 
   Li em algumas resenhas a ideia de que esse final pode ser feliz, porque Yeonghye finalmente consegue impor sua vontade. Mas a que preço? Não vejo nada positivo no desfecho - ele é apenas a conclusão de que o machismo e a repressão enlouquecem as mulheres.
   Esse é um livro que pode não agradar a todos, ainda mais porque, penso, há um esforço proposital em ser chocante, incompreensível e bizarro. Mas gostei das reflexões que o livro me trouxe enquanto tentava relacionar algum significado para essa história.
   Nota 8 - bom livro

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Nascida no interior de SP, formada em Publicidade e Propaganda, sempre gostou de dar palpites sobre filmes, séries, animes, livros e o que mais assistir/ler. Autora do Blog "Resenhas e Outras Cositas Más" (Miss Carbono) e "Coisas de Karol". No Twitter fala de política, séries e da vida (não necessariamente nessa ordem). Siga: @karolro


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