|Resenha| A insustentável leveza do Ser - Milan Kundera

sexta-feira, julho 15, 2016 0 Comments A+ a-


   Um antigo filosofo dizia que a vida era dividida entre opostos: amor e ódio, positivo e negativo, claro e escuro, leveza e peso etc. As primeiras, amor, claro e leveza, segundo ele, seriam coisas positivas, enquanto que ódio, escuridão e peso seriam coisas negativas. Mas a leveza é realmente algo positivo? Ao longo da vida, tomamos determinada atitude apenas uma vez e é somente por essa única vez que nossas atitudes, sem o "peso" que um eterno retorno traria, se tornam efêmeras e vazias de significado. 
   É dessa reflexão que começa o romance "A insustentável leveza do ser". Nele, o autor checo Milan Kundera nos apresenta os personagens Tomas, Tereza, Sabina e Franz, utilizando da história dessas personagens e de seus relacionamentos como metáfora para reflexões sobre o comunismo, a traição, a vida, o amor, a religião... 
   Os temas que Kundera aborda nesses livros são muitos mas creio que o principal seja esse embate entre peso e leveza, e a forma como os quatro personagens encaram essas potências. Tomas e Sabina são do tipo que favorecem a leveza na vida e nos relacionamentos. Tomas chega a deixar de ver um filho por anos, ao entender que sua ex-esposa estava fazendo um jogo impedindo-o de ver. Já Sabina passa a vagar pelo mundo, sempre pulando de uma traição a outra.
   Do outro lado no espectro das relações amorosas estão os constantes Franz e Tereza. Franz sente-se apaixonado e obcecado por Sabina, já que esta lhe deu sua liberdade, algo que ele, como um acadêmico casado a mais de 20 anos, jamais esperava recuperar (se é que algum dia teve). Já Tereza viu em Tomas seu salvador, aquele por quem havia abandonado sua vida medíocre a muitos anos atrás. Tereza sofre com as infidelidades de Tomas porque acha que não é suficiente para ele; mas Tomas quer que Tereza entenda que a força de seu amor está em sempre querer retornar a ela, não importa o que faça. 
   É um livro relativamente pequeno (a versão pocket tem 302 páginas) mas que está cheio de temas e de reflexões. Embora a narrativa principal seja a desses quatro personagens, os momentos que mais gostei do livro são aqueles em que o autor faz pequenas divagações sobre a República Tcheca e sobre o comunismo que, durante toda a Guerra Fria, dominou aquele país. Eu, que sei muito pouco sobre esse país (apenas sabia o nome de sua capital, Praga) fiquei impressionada com a história de opressão do povo tcheco e mais ainda, com a apatia que neles cresceu quando confrontados com toda essa opressão. Claro, essa é a visão do autor, não sei se de fato foi assim, mas gostei mesmo desses momentos, além das pequenas informações sobre como é viver num regime comunista. 
   Porem, se tiveram momentos do livro que e u amei, também houve aqueles que eu odiei. Dois momentos, na verdade, um por "culpa" do autor e outro por "culpa" da Editora. A "culpa" do autor se dá quando, a certa altura do livro, ele narra uma situação inverosímel vivida por Tereza, quando esta sobre uma montanha a pedido de Tomas. Como a personagem costuma ter diversos sonhos ao longo da história, achei que fosse mais um desses sonho, mas me incomodou muito que o autor tivesse deixado esse momento no ar, deixando o leitor a deriva sobre se aquilo aconteceu ou não (só mais ao final é que cheguei a conclusão de que não aconteceu, mas ai já tinha ficado irritada). 
   O outro ponto questionável do livro é a revisão feita pela Companhia das Letras. Tudo bem que é um livro em formato econômico mas esperava que, fora todos os aspectos estéticos (qualidade das folhas, tamanho do livro etc.) o livro mantivesse a edição e revisão de qualquer grande lançamento da Companhia das Letras, o que não ocorre. Cheguei a conclusão de que nenhuma pessoa leu esse livro por inteiro antes dele ser publicado e dessa falha resulta que a cadela do casal Tomas e Tereza, Karenin, mude de gênero durante os capítulos. Em alguns se referem a Karenin por "ela", em outros por "ele", e o livro segue dessa forma bizarra até o final. Pode até ser que isso seja coisa do autor (o mesmo diz em alguns momentos que a cadela tem nome e atitudes de macho) mas há um outro momento na pág.131 em que a falta de revisão se torna grotesca. Reproduzo: 
"Aliás, Tereza constatara havia algum tempo que não era desagradável começar o dia com o chamado de Karenin. Para ele, a hora de acordar era de pura alegria: espantava-se ingênua e bobamente de ainda estar vivo e se alegrava sinceramente com isso. Tereza, em compensação, acordava a contragosto..."
   Essa cena é bizarra porque mostra o mesmo personagem, Tereza, tendo duas reações opostas ao ser acordado pela cachorra (o) Karenin. Depois de ler o texto uma segunda vez percebi que uma dessas reações (provavelmente a primeira) era de Tomas e a outra de Tereza; esse momento foi um divisor de águas para mim, porque foi depois disso que passei a notar outros erros de revisão, como a alternância de sexo do cachorro.
   Falei muitas coisas da edição mas e o livro?  No geral é uma história interessante, com reflexões interessantes. Recomendo aos que gostam de livros com abordagens mais filosóficas e que possuem narrativas não-lineares, como é o caso de "A insustentável leveza...".
   Eu gostei da história mas não é um livro que me marcou o suficiente ou que eu queira reler, razão pela qual pretendo me desfazer do livro. No entanto isso não desmerece a trama, quero conhecer mais histórias do autor e realmente indico para quem quer passar as horas de forma mais intelectual: embora não tenha me despertado nenhuma emoção profunda esse livro me fez pensar em várias coisas. Acho que era esse o objetivo do autor.
   Nota 8 - bom.

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Nascida no interior de SP, formada em Publicidade e Propaganda, sempre gostou de dar palpites sobre filmes, séries, animes, livros e o que mais assistir/ler. Autora do Blog "Resenhas e Outras Cositas Más" (Miss Carbono) e "Coisas de Karol". No Twitter fala de política, séries e da vida (não necessariamente nessa ordem). Siga: @karolro


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